segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Entrevista parte 2

CH: Você já pensou em sair da empresa?
GG: Não

CH: Só curiosidade.
GG: Mas ninguém nunca me perguntou isso. Ninguém nunca disse,”Por que não se junta a nós?” Ninguém nunca ousou dizer isso. Todos entendem a essência de duas pessoas que vieram para se tornar um.

CH: Mas você nunca pensou em fazer outra coisa?
GG: Nãom Valentino e eu somos muito temperamentais. Nós temos personalidades fortes. Nós brigamos, mas eu nunca pensei em sair. E não tenho arrependimentos.

CH: Você se lembra quantas licenças vocês tiveram no pico?
GG: Talvez 70. Só no Japão foram 35, mas isso foi engraçado. “Oh, eu preciso de dois milhões de dólares a mais este ano, o que podemos fazer? Vamos fazer banheiros.” (risos) Nós fomos a esta companhia que fazia azulejos. Depois de dois anos, todo mundo tinha azulejos com assinatura. Nós fomos ingênuos no nosso entusiasmo. No lançamento, eu tinha todos os jornais da Itália – e você sabe, na Itália, nós temos mais jornais do que pessoas que os lêem – colocamos um anúncio nas costa das revista com uma grande foto de Valentino. A chamada era “Valentino está no seu banheiro, agora”. Eu nem considerei o quão ridículo isso era. Para mim era divertido.

CH: Balenciaga já fez roupas para funeral para o mercado Japonês. Foi dessa forma que Nicolas Ghesquiere teve seu início nesta companhia.
GG:Nós perdemos capas em um tecido – algo como um casaco da Prada, bem cheio de babados – e isto foi usado para cobrir o toilet. Nós fizemos isso.

CH: Provavelmente isto não feriu o nome Valentino.
GG: Eu sempre pensei que se você tivesse um super prestigio, e uma figura icônica como Valentino, aí você pode criar/crescer alguma coisa a mais. É claro, nós balanceávamos isso com algo glamuroso.


CH: A estrutura hoje é tão diferente. Os estilistas são realmente empregados de grandes companhias. Eles são bem recompensados, mas eles não tem o que você e Giorgio Armani e Saint Laurent têm. Eles são parte de uma máquina. Se eles não tiverem boa performance eles podem ser demitidos. Eu fico imaginando o que isto significa para a atmosfera da moda, a criatividade.

GG: Há um jogo diferente hoje em dia. Provavelmente os estilistas são muito mimados. Eles não tem tempo para crescer e desenvolver uma identidade então eles não podem durar muito. Nós temos 3 vezes mais casas que precisam de estilistas do que bons estilistas por aí. E a imprensa faz deles celebridades em segundos. Nós tivemos a chance, Valentino e eu, de crescer. De ir passo à passo. Ontem, era muito interessante ver estes novos estilistas sendo honrados pela CFDA.


CH: Acredito que a CFDA faz um ótimo trabalho, mas poucos dos novos estilistas tem condições de criar raízes. Tem um grupo aqui (Nova York) e tem um grupo em Londres. Mas quantos irão ter sucesso? Muitas vezes parece celebridade de Hollywood. Há várias atrizes que não ouvimos falar mais, eles vêm e voltam. Ficar no “poder” quer dizer, talvez, 5 anos.

GG: Isto é verdade. As “estrelinhas” tem mais publicidade do que Meryl Streep ou Gwyneth. O mesmo é verdade para os estilistas. Eles estão distraídos, estão contaminados. “Vamos fazer Target, vamos fazer H&M”. Eles são imediatistas, se tornaram famosos. Mas, novamente, eles não tem tempo de crescer. Como Valentino e Karl duraram 47anos?

CH: Minha teoria é de que , apesar de Karl e Valentino serem pessoas muito diferentes, com diferentes focos profissionais, ambos são extremamente bem treinados. Eles sabem como fazer lindas roupas, e como estar contemporâneo. Esta é uma qualidade rara.
GG: Eles, também, tiveram a modéstia de aprender. Lembro de quando Valentino veio para Roma de Paris. Roma em 1960 era a Via Veneto, “La Dolce Vita”. E havia outro cara lá – Karl – na Via Veneto. Ele trabalhava para uma casa que você nunca mais vai ouvir falar – Tiziani. Ele era simples, modesto, tomando seu próprio cappuccino. Eu nunca entendi porque Karl nunca fez a Karl Lagerfeld uma grande marca.

CH: Sempre pensei que a principal preocupação de Karl era ficar preso. Ser o “dono” quer dizer um peso a ser carregado. Você e Valentino ficaram flexíveis, mas penso que para outros estilistas, como Armani, tem sido mais difícil, por mais bem sucedido que ele seja. Você pode ficar isolado.
GG: E talvez com Valentino acontecesse o mesmo. Eu falei com Giorgio Armani duas semanas atrás em Londres, nós fizemos Fashion Rocks juntos. Eu fui à uma sala onde havia 4 estilistas – Chanel, Armani, Versace e Valentino – fazendo provas. Eu olhei para as roupas de Valentino, vi pessoas da Versace e Chanel, e vi o Sr. Armani no chão. Colocando alfinetes em um vestido. Eu disse, “Giorgio, muitos e muitos anos atrás quando Sergio (Seu parceiro Sergio Galeotti) morreu, você me disse, ‘Agora eu tenho de fazer tudo só’ Isto foi a 30 anos atrás!”, e ele falou, “Sim”, eu disse, “Você está abrindo um prédio em Tokyo – você também está acompanhando aquilo?” Ele disse, “Sim”.
Ele me disse, “Você está se aposentando agora, mas o que eu faria se me aposentasse?”, e eu disse para ele, “É sua culpa, porque você não construiu mais nada.”. E ele falou, “Isto é verdade. Eu não tenho amigo, eu não tenho namorado, eu só tenho meus gatos. É tudo que tenho”, ele está preso.


CH: O que você não vai sentir falta na moda?

GG: Olhar os jornalista de uma certa forma! Não estou dizendo nada incrível. Mas você não precisa dizer a alguém o quão maravilhoso ele está se você não o acha. Você sabe? A hipocrisia da moda – todo mundo é lindo, todo mundo é maravilhoso, todo mundo está feliz de te encontrar. (risos) Eu comecei na moda com 20 anos, eu vim de uma família de burgueses. Eu estudava arquitetura, a moda foi a minha primeira introdução ao mundo. Desde então eu tive que jogar um determinar. Graças a Deus, estar em Roma, estar longe do dia a dia do mundo da moda, nos deu uma certa distância e a possibilidade de não estar muito envolvido ou influenciado. Agora, posso ser um amigo seu, porque você é inteligente e não porque amanhã irá escrever algo no jornal.
Também, Valentino e eu temos família, mesmo não sendo nossa própria família. Nós temos vida, temos casa. Sempre desfrutamos de coisas fora da moda. Valentino e eu falamos de moda fora do escritório. Nunca.

CH: Você e Valentino deram ao mundo da moda e ao público, acesso a um mundo incrível. Eu senti isso nas festas em Roma este verão. E o fato de John Fairchild realmente ter reconhecido que as notícias interessantes estão nos estilistas, no momento certo.
GG: Foi o John que fez estilistas estrelas. Estamos descobrindo agora o enorme respeito que a imprensa tem por Valentino, e também de outros estilistas. Mas as vezes a imprensa procura por outras coisas que nos fazem sentir negligenciados e “so passé”. Este não é um bom sentimento.


CH: Eu sei o que você quer dizer, e sou culpada por fazer isso. Como uma repórter, estou a procura da notícia/novidade, apesar de gostar de passar o meu tempo com a velha geração. Você aprende muito.

GG: Vamos dizer que a imprensa vai do Christopher Kane e faz dele um ídolo. Ele tem uma boa coleção, mas ele se transforma em estrela em 5 minutos. Você acha que isso é saudável para ele?

CH: Bem, eu acho que a imprensa londrina tem a habilidade de bombar alguém, e o resto do mundo nunca ouviu falar da pessoa.
GG: Aquilo é uma ilha. Mas , com certeza, Christopher Kane terá um grande trabalho. Não sei para onde ele está indo, talvez Ungaro. Mas aí, se ele falhar, depois de uma estação, ele voltará para sua irmã e continuará a fazer vestidos. É culpa da imprensa?

CH: Eu creio que sera culpa de Christopher e de suas decisões.
GG: Imagine quantos atores fazem um maravilhoso filme, ganham um Oscar, e depois desaparecem, por temerem cometer um erro. Você acha que Christopher Kane é responsável se ele falhar amanhã? Esta não é a responsabilidade das pessoas que o colocam em um lugar onde ele não está confortável?

CH: Ele pode dizer não.
GG: Não, você não diz não.

CH: Então ele tem de tomar cuidado com a exposição.
GG: Mas quando você tem 23anos e se torna uma estrela, e você recebe 12 linhas no jornal e Gaultier tem só 4 linhas, você perde o controle.

CH: Sim, mas olhe Azzedine Alaia. Ele nunca parou de fazer roupas maravilhosas, mesmo quando não recebia atenção. E jovens estilistas o idolatram hoje em dia. Ele pegou a estrada mais longa.
GG: Hoje, jovens estilistas, depois de uma estação tem Fabien Baron como diretor de arte, um stylist para o desfile, e tops irão vê-lo só para desfilar um vestido. Então, eles já estão na máquina.

CH: Escute, não descordo de você. A máquina é mortal, e não estou debatendo Anna Wintour e seu trabalho na Vogue. É uma revista de sucesso, mas é parte da máquina, e as pessoas podem dizer não. Alaia disse não, Margiela disse não, Raf Simons disse não, muitas pessoas disseram não: “Eu posso fazer do meu jeito”, e criam trabalhos realmente interessantes.
GG: Então (rindo), para a questão anterior, estamos realmente contentes de estar fora da máquina. É muito interessante isso, como escritor, você pode mostrar algo que todos nós criamos, incluindo você mesma.

CH: Eu somente acho sempre bom revisar como você faz o trabalho. Uma coisa que as pessoas estão curiosas para saber é como você continua no controle da companhia após você vende-la 10 anos atrás?
GG: Eles tentaram colocar suas próprias pessoas lá, mas eles não tinham personalidade fortes. E acredito que Valentino e eu temos personalidade forte. Também temos uma enorme companhia de pessoas que nos acompanham a 20 ou 30 anos. Eles escutariam a nós, o contrato nos deu possibilidade de dizer,”Eu quero esta pessoa no meu escritório... pode contratar tal pessoa, não pode demitir tal pessoa”. Como o negócio estava indo bem, era uma combinação de know-how, pessoas a nossa volta e o contrato. Eles tentaram, claro, colocar CEOs. Nós vimos mais CEOs vindo e indo do que secretárias.

CH: Seu poder frustrou esses executivos?
GG: Eles tiraram vantagem disso, eu acho, no final, porque as coisas estavam indo tão bem. Mas, de novo, tudo estava indo bem até 6 meses atrás, quando a empresa foi vendida de novo e nós pensamos, “Por que continuar?”, O final em julho é algo difícil de assimilar – não porque foi lindo, mas porque foi tão emocional para nós. Então por que esticar por mais um ano? Será emocionante em janeiro e difícil para Valentino por alguns meses, mas ele terá outros projetos. Não estaremos em montanhas com aquarela pintando casa de Gstaad.

*CFDA: Council of Fashion Designers of America
**CEO: Chief Executive Officer

por Rutu Modan